23 de maio de 2012

MR Catra e a naturalização da opressão sobre a mulher.




                Recentemente, têm feito muito sucesso as canções de funk do cantor Mr. Catra. Sua obra é marcada com músicas de letras repetitivas, pesadas e machistas. Um de seus hits mais recentes é a música “Uh Papai Chegou”. Esta música, assim como “Adultério”, são músicas que chegam ao extremo do machismo e tratam as mulheres como mero objeto do prazer sexual dos homens.
                Porém, nos últimos meses, a caricatura de Catra tem chamado muito mais atenção na mídia por assumir publicamente que é defensor e pratica a poligamia. Catra tem 20 filhos com várias esposas e hoje diz ter 4 amores. No fim do mês de março participou de uma entrevista no programa de Luciana Gimenez. O programa, assim como o vídeo-documentário “90 dias com Catra”, serviu para entender melhor o que significa a poligamia defendida por Catra.
                                 Segundo o cantor, a relação entre as esposas é extremamente natural e há uma harmonia na família, na qual as mulheres se respeitam e se tratam como irmãs. Segundo o cantor, “elas se gostam por gostar do mesmo homem, se respeitam por gostar do mesmo homem”, portanto, não há problema e sua família é uma família feliz. Porém, Catra diz que a poligamia é uma relação típica dos homens e, portanto, não aceitaria ser traído. O cantor diz a natureza ser assim, por isso o gorila tem várias macacas, o leão é de várias leoas e o cavalo possui vária éguas, “todo mamífero tem várias fêmeas”. Segundo Catra, “o vento que bate daqui não é o mesmo que bate daí” e se uma de seus “amores” tivesse outro marido, ela o teria longe dele, seguindo o caminho dela. Por isso, Catra vê o Rei Salomão como o homem mais sábio do mundo, seu ícone. O Rei Salomão é uma figura bíblica que teve 700 mulheres e 300 concubinas e teria governado Israel há 2944 anos atrás.
                O modelo de família de Catra respeita uma hierarquia na qual o homem seria o “Leão da casa”, a esposa teria o cuidado de administrar o lar, lavar roupas, cuidar dos filhos e do marido. Catra trabalharia e proveria a casa, dando segurança. O que mais espantou nas declarações de Catra foi a defesa aberta e sem medidas da opressão da mulher.

A hipocrisia da sociedade e a naturalização da opressão.
               
                O grande diferencial de toda discussão de Catra é a forma aberta e sem esconderijos em que assume a opressão em suas letras e declarações. Catra diz em palavras claras o que nesta sociedade é hipocritamente escondido sob o falso véu da “igualdade de direitos” e do “fim da opressão sobre a mulher”. A moral hipócrita desta sociedade capitalista diz ter dado todo o espaço às mulheres, pinta o quadro de uma sociedade no auge do desenvolvimento humano em que as mulheres conquistaram todo seu espaço nas famílias, organizações públicas e privadas, com plena liberdade sexual, política e organizacional. É verdade que como resultado de décadas de lutas do movimento feminino e da classe trabalhadora, as mulheres avançaram na conquista de muitos direitos em vários terrenos, para além de hoje garantirem relativamente sua independência financeira ao entrarem no mercado de trabalho. Porém, ainda padecem da opressão de uma sociedade patriarcal, são estupradas, espancadas, exploradas, assediadas e excluídas socialmente.
                Enquanto se pinta falsamente um moral da igualdade dos sexos, do matrimônio e da monogamia, observa-se na sociedade o aprofundamento da violência sobre as mulheres, a prostituição e o descaso do Estado e dos governos com a saúde, educação e vida das mulheres deste Brasil. Isto ocorre porque esta sociedade, na prática, convive e alimenta a opressão sobre a mulher. Ou seja, na sociedade, há uma moral com duas faces, a pública e a restrita, a hipócrita e a oculta. A face hipócrita engana, prega a igualdade, a monogamia, o amor e o casamento. A verdadeira, a oculta, estimula a opressão da mulher, a sua banalização sexual, a poligamia para os homens, o uso da prostituição e a desigualdade sexual das mulheres.
                Catra é a expressão de um novo patamar da opressão da mulher. Catra não usa da hipocrisia da sociedade e assume a opressão sem rodeios e sabe muito bem disso. O próprio cantor acusa a sociedade de ser contraditória e hipócrita: "A sociedade fala que a mulher tem que ter um homem só e que o homem só tem que ter uma mulher, mas essa sociedade não me responde por que existe prostituição, menor abandonado e mãe solteira." Quanto à poligamia , quando questionado por que seus amores também não poderiam ter outras relações, Catra perguntou à entrevistadora como a sociedade qualifica isto.
                A opressão sem falsos discursos de Catra, contudo, não é nada progressivo em relação à opressão mascarada. A “filosofia” do funkeiro representa, ao todo, um grande retrocesso ideológico na sociedade, tanto que já não está sendo necessário esconder a opressão com a máscara da igualdade de direitos entre os sexos. A despreocupação de defender a desigualdade sexual e social da mulher encontra em Catra somente mais um dos defensores.
                Na verdade ocorre um processo de fortalecimento do machismo e uma despreocupação cada vez maior de escondê-lo. Recentemente, foram presos dois paranaenses por incitar a violência a negros, gays, comunistas e mulheres. Os dois incitavam o estupro às mulheres e a prática da pedofilia por um site da internet. Outros dois casos recentes também repercutiram. O primeiro foi o de um grupo de estudantes de direito do Paraná que distribuiu um manual de instruções a calouros, o qual incitava o estupro em mulheres. O outro foi o fato de STJ ter absolvido um homem que estuprou três meninas de 12 anos com a alegação de que elas seriam prostitutas. O caso do STJ demonstra como a opressão sem medidas sobre as mulheres não se expressa somente na voz do cantor, mas se reproduz mesmo em toda a sociedade, impulsionada através da justiça, dos governos e do Estado.

Por que a opressão sobre o gênero feminino é tão forte nesta sociedade?
               
                Para nós do PSTU, a desigualdade entre homens e mulheres assim como entre negros e brancos, homossexuais e heterossexuais, somente existem em função de outra desigualdade: entre ricos e pobres, entre trabalhadores e patrões. O capitalismo não foi capaz de libertar as mulheres do julgo da opressão e de lhes dar toda a liberdade por que é fundamental para este sistema o uso da opressão para sobreviver. O capitalismo utiliza a opressão para obter mais lucros e a prova mais concreta disto são os dados que demonstram que as mulheres recebem em média, no Brasil, 33% a menos que os homens, exercendo a mesma função com a mesma carga horária de trabalho. Além disso, como um todo, estão nos postos de trabalho mais precarizados e sem muitos direitos básicos.  O capitalismo superexplora as mulheres trabalhadoras e através do machismo, da ideologia de inferioridade e submissão da mulher, cria as condições para que as mulheres tenham os piores salários e as piores condições de trabalho. O machismo também tem um papel fundamental de dividir os trabalhadores, enfraquecendo-os na luta contra os patrões.
                Assim como no terreno sexual, no terreno social a moral hipócrita diz que as mulheres conquistaram seu espaço e já estão no mercado de trabalho, assim como nas instituições políticas. Porém, não se revela as condições as quais as mulheres trabalham e vivem. Não condena a dupla jornada de trabalho da mulher, assim como a estimula. Catra em entrevista, diz o que a moral dissimula: “machista é botar a mulher pra trabalhar, é querer que sua mulher seja independente.” Esta sociedade nos ensina que o cuidado com os filhos, com a casa, roupas e comida é assunto privado. Com isso, o Estado se desobriga da manutenção da força de trabalho e através do trabalho doméstico exercido pelas mulheres garante maiores lucros ao capital, evita gastos.
                Para entender o que foi dito nos últimos dois parágrafos, nada melhor do que as palavras do empresário (dono de uma marca de roupa), cantor e honesto Catra, quando perguntado se as mulheres dão gastos. Catra disse: “Mulher não dá gastos. Mulher dá lucro. Mulher lava as roupas, limpa a casa, cuida dos filhos, trabalha...”.

Somente a luta pode mudar.
               
                Somente a luta dos trabalhadores unidos, homens e mulheres, poderá trazer a liberdade de todos e a plena libertação da mulher do julgo da opressão e da exploração. Para tanto, devemos começar desde já, lutando pelo direito de igualdade das mulheres em todos os terrenos. Devemos incluir nesta luta a intolerância a qualquer forma de violência contra a mulher. No Brasil, a cada 2 minutos, 5 mulheres são espancadas. A cada dia, 10 mulheres são mortas no Brasil. Não é justo e não faz nenhum sentido que em um país governado por uma mulher, tantos casos de violência contra as mulheres passem impunes, como no caso de absolvição pelo STJ de um estuprador de menores, assim como em muitos outros.
               
Contra toda forma de violência contra mulher!
Aplicação e ampliação da Lei Maria da Penha!
Chega de opressão!
Aplicação e ampliação da Lei Maria da Penha
Pelo fim da mercantilização do corpo da mulher!
Proteção imediata às mulheres agredidas e punição aos agressores!

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