7 de novembro de 2012

NO MÊS DA CONSCIÊNCIA NEGRA NEM TODOS SÃO "ZUMBI"!


Por Glailson Santos

Na esteira do escândalo do mensalão a mídia burguesa tem feito um grande alarde em relação à atuação do relator do processo, o Ministro Joaquim Barbosa. Mas quem é este magistrado negro que ousou condenar o alto escalão petista? Seria ele o homem que precisamos para moralizar o país? 
Consciência Negra x Mídia Burguesa
No mês de novembro comemoramos o dia da consciência negra. Uma data dedicada à reflexão sobre as origens históricas e a atual situação de exploração e opressão a qual estão submetidos milhões de negros e negras no Brasil e no mundo. A data foi escolhida em referência à morte do líder quilombola Zumbi dos Palmares, assassinado por forças portuguesas em 20 de novembro de 1695. Nesse sentido, é interessante notar como a mídia burguesa vem retratando negros e negras na atualidade. Uma análise que nos oferece valiosos elementos sobre o quanto o capitalismo tem sido incapaz de superar o abismo social que insiste em segregar brancos e negros passados três séculos da sangrenta destruição de Palmares. 
Dois programas televisivos, atualmente no ar na principal emissora do país, nos dão uma ideia bem representativa da forma como a mídia burguesa e os poderosos costumam encarar o problema da segregação racial. O primeiro é o folhetim televisivo "Lado a Lado", que ao resgatar o papel histórico das maltas e capoeiras é celebrado pela grande mídia por abordar a questão do racismo na sociedade carioca do inicio do século XX.
No entanto, vemos esse discurso politicamente correto, e que é usado para agregar valor ao produto global, desabar como um castelo de cartas quando voltamos o olhar ao segundo programa. Um grotesco quadro, pretensamente humorístico, protagonizado pelo ator Rodrigo Sant'anna no Programa Zorra Total. Esse humorista, atrás de próteses e maquiagens que flagrantemente buscam caçoar de características físicas do povo negro, dispara tiradas racistas como esta: “durante a enchente não pude ficar sem minha palha de aço, daí corri atrás para pegá-la e quando vi, eram os cabelos da minha filha”. 
O exemplo Obama e as frustrações do movimento negro internacional 
Mas não é só através de seus programas televisivos que a mídia burguesa e os poderosos expõem sua hipocrisia sobre a questão racial e tentam manipular a opinião pública. Tão eficiente quanto conferir um discurso politicamente correto em seus produtos televisivos, ou quando faz o racismo mais odioso penetrar nas casas de milhões de brasileiros sob o disfarce de uma “inocente” piada, a burguesia é especialista em usar os anseios e expectativas do movimento negro contra o próprio movimento. Isso aconteceu com o fenômeno em relação à eleição de Barack Obama, o primeiro presidente negro da história dos EUA, e estamos presenciando novamente com a campanha em torno de Joaquim Barbosa.
No recente julgamento do mensalão, assistimos  um grande bombardeio da mídia em relação à atuação do Relator do Processo, o Ministro Joaquim Barbosa, que acaba de ser eleito Presidente da mais alta corte do país com sua posse marcada convenientemente para este mês de novembro, o mês da Consciência Negra. Negro, de origem pobre, descrito quase sempre como um homem rigoroso e integro, Barbosa é apontado por muitos como responsável pela condenação de boa parte dos envolvidos no Mensalão.
Barbosa é aclamado pela mídia burguesa como um legitimo herói brasileiro, ao ponto de já estar em curso uma campanha na internet para que ele concorra ao cargo de presidente da república nas eleições de 2014. Nada disso seria extraordinário se tal empolgação não atingisse importantes setores de ativistas do movimento negro e da esquerda que depositam grandes expectativas em relação à “retidão de caráter” que atribuem ao ministro.
Diante desse fenômeno, mais do que nunca, precisamos recordar que o fato de termos um negro como Presidente do Supremo Tribunal Federal, ou mesmo como Presidente da República, está muito longe de significar o fim, ou mesmo um avanço significativo em relação ao racismo e a miséria que assolam os trabalhadores negros.
O exemplo de Obama, nos EUA, demonstrou veementemente essa dura verdade, como fica explicito na declaração de Angela Davis, histórica militante dos Panteras Negras e do movimento por direitos civis dos negros norte-americanos, em uma recente entrevista ao Jornal Página 12: “ [...] é triste dizer, mas as coisas são piores com um presidente afroamericano na Casa Branca. Essa é a ironia. Porque há meio século era impensável que um negro chegasse, algum dia à presidência dos EUA. Hoje, é possível. Mas também é preciso dizer que ninguém, na Casa Branca, hoje, está preocupado com o fato de que há um milhão de negros nas prisões norte-americanas.” 
Lições Históricas do Movimento Negro
A capacidade de colocar um ponto final no racismo e em todas as formas de opressão e exploração que vitimam, sobretudo, os trabalhadores, os desempregados e a juventude pobre não é uma questão de caráter, mas uma questão de romper a lógica de dominação e exploração imposta pelo sistema capitalista.
A razão para que não seja possível eliminar o racismo sob a égide capitalista é simples, ele é lucrativo. Através de ideologias opressoras como o racismo, o capital impõe um nível de exploração ainda maior a determinados setores da classe trabalhadora que lhe permite aumentar seus lucros. E em uma sociedade pautada pela busca desenfreada por lucros cada vez maiores, ideologias como o racismo são uma parte inerente do sistema de exploração/opressão dos trabalhadores.
Joaquim Barbosa, que chegou ao posto de Ministro do STF por indicação de Lula e é eleitor declarado do PT, longe de se opor ao sistema é um defensor da ordem capitalista no sacrossanto “Estado Democrático de Direito”. Como bem sabem os movimentos sociais e sindicatos que enfrentam cotidianamente a ameaça da criminalização e das liminares que na pratica atentam contra o direito de organização e contra as lutas dos trabalhadores.
O poder judiciário, no qual o ministro ocupa um papel de destaque, é um dos pilares do sistema de dominação dos poderosos, tão maculado pela corrupção quanto os demais poderes. Prova disso é o escândalo dos Bandidos de Toga no final do ano passado, episódio no qual a corregedora do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Eliana Calmon, denunciou o desvio de R$ 855 milhões em movimentações bancárias “atípicas” que teriam beneficiado magistrados e servidores do judiciário entre 2000 e 2010.
Os negros quilombolas que no século XVII ergueram na Serra da Barriga um estado independente e enfrentaram os capitães do mato, quase sempre negros como eles próprios, já sabiam que para lutar de forma consequente contra o racismo e a exploração é preciso bem mais do que negros respeitáveis acolhidos no seio da elite branca. O que precisamos é de um movimento negro organizado e comprometido com as lutas de todos os trabalhadores e setores explorados (sejam negros, indígenas ou brancos).
Precisamos de um movimento disposto a subverter a ordem imposta pelos poderosos, pois enquanto o capital segue aplicando a velha máxima burguesa “Dividir para Conquistar”, colocando trabalhadores brancos contra trabalhadores negros, trabalhadores contra trabalhadoras e trabalhadores heterossexuais contra seus companheiros homossexuais, nós reafirmamos o chamado de Marx: “Trabalhadores do mundo uni-vos!”, para que juntos, explorados de todas as raças, sexos, crenças, nacionalidades e orientações sexuais construamos um mundo livre de todas as formas de opressão e exploração, um mundo socialista!

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