Por Zé Maria (PSTU Nacional)
A presidenta Dilma Rousseff apressou-se para, em cadeia
nacional de televisão, falar à população acerca do Leilão do campo de Libra do
pré-sal brasileiro – que vendeu (ou doou?) entre 8 e 10 bilhões de barris de
petróleo por míseros 15 bilhões de reais, para o único consorcio “concorrente”,
dia 21/10. Para tentar justificar essa barbaridade, a presidenta tratou de
reafirmar vários mitos que tem sido disseminados pelo governo sobre este
assunto.
O primeiro mito é que o petróleo segue sob controle do
Brasil. Não é verdade. Apesar de a Petrobras encabeçar o consorcio contemplado,
60% do seu capital é estrangeiro. Só isso já coloca o campo de Libra sob
controle das petroleiras transnacionais, entre elas a Shell e a Total. Se
somarmos a isso o fato de que os governos tucanos (com FHC) e petistas (com
Lula e Dilma) já venderam para o capital estrangeiro cerca de 44% das ações da
Petrobras, temos que o nosso petróleo, e a própria Petrobras está, sim, sendo
entregue ao capital privado. Se isso não é privatização, é o que?
Acrescente-se aqui que o capital que controla estas grandes
petroleiras (entre elas a Shell e a Total, que participaram diretamente do
leilão) está todo sob domínio de duas grandes famílias, uma norte-americana
(Rockfeller) e outra europeia (Rothschild). Através dos bancos que controlam,
estas duas famílias são donas de quase todas as grandes petroleiras do mundo,
inclusive das ações da Petrobras que foram negociadas no exterior. Assim vemos
também que não é bem verdade que as petroleiras norte-americanas se retiraram
do leilão. Elas estão associadas às empresas que assumiram o controle do campo
de Libra. Os donos são os mesmos.
O segundo mito é que se tratou de um bom negócio para o
Brasil. Outra mentira. Segundo o consultor legislativo da Câmara dos Deputados
para Assuntos de Petróleo e Gás, Paulo César Ribeiro Lima, um dos maiores
especialistas em energia do Brasil, a parcela de 41,65% do excedente em óleo
para o Estado brasileiro é muito baixa, muito aquém da prática dos leilões ao
redor do mundo, na qual os governos ficam com cerca de 60% a 80% da partilha,
em contratos como o que foi feito aqui. No caso da Noruega, por exemplo, em
contratos desta natureza, o país fica com pelo menos 60% do excedente. Ou seja
estamos diante daqueles negócios de “pai para filho” que foi muito bom, sim,
mas para as petroleiras internacionais.
Mas esse quadro fica ainda pior se considerarmos as
condições estabelecidas no contrato de concessão. Segundo Ribeiro Lima, pelas
regras do edital, a remuneração de 41,65% é calculada numa perspectiva de
produção de 12 mil barris por dia, cada um no valor entre USD 100 (dólares) e
USD 120 (dólares). Se a produção e o preço do barril subir, a parcela do Estado
brasileiro do excedente em óleo sobe para 45,56%, contra 54,44% para as
empresas. Mas se ambos caírem, pode chegar a alarmantes 9,93%. E isto não está
para nada descartado, ainda mais depois que os EUA decidiu produzir óleo a
partir do xisto.
O terceiro mito é que era necessário o Leilão para que
houvesse investimento suficiente para a exploração imediata do pré-sal. Ora,
quem disse que o Brasil precisa explorar imediatamente todo o pré-sal?
Economicamente seria muito mais vantajoso para o nosso país uma exploração aos
poucos do petróleo encontrado no pré-sal. O Brasil não precisa de produção e
este ritmo. Poderíamos muito bem guardar essa riqueza imensa onde ela está e ir
explorando aos poucos, na medida da necessidade para a autossuficiência do
país. E assim esta riqueza duraria mais, servindo também às futuras gerações
E para isso não seria necessário o investimento estrangeiro,
pois a Petrobras e o Brasil tem recursos para a exploração nestas condições. As
petroleiras internacionais sim, querem esta exploração imediata de todo o
pré-sal. Querem comercializar nosso petróleo no mercado internacional e lucrar
muito com isso. Ou seja a Petrobras e a exploração do petróleo brasileiro não
estão a serviço dos interesses do Brasil, e sim a serviço das multinacionais e
do tal “mercado internacional” de petróleo!
O quarto mito é que o leilão vai resolver o problema de
recursos para a educação e para a saúde. Outra mentira. A presidenta chegou a
falar na TV, em de 270 bilhões de reais em royalties. Só que, mesmo se levamos
a sério os valores anunciados pela presidenta, eles seriam a soma acumulada até
2035!!!. Ou seja, pouco menos de 20 bilhões de reais por ano (considerando que
a produção comece em 2018). E isso se desconsiderarmos a hipótese de que o
mínimo excedente venha a cair, em função de queda na produção e preço do óleo
no mercado internacional, como apontado acima.
É muito menos do que o necessário para assegurar saúde e
educação de qualidade para o povo brasileiro. O Brasil precisa de pelo menos
450 bilhões ano, só para a educação pública. E este objetivo poderia sim, ser atingido
se todo o petróleo ficasse para o país. Ao falar nos 750 bilhões gerados pelo
excedente, Dilma precisaria ter dito também que, se o petróleo ficasse todo com
o Brasil este número seria ainda mais “impressionante”, para usar as palavras
da presidenta. Quantos recursos mais não seria possível dedicar à educação e à
saúde?
Sem dúvida somaríamos muitas centenas de bilhões nos números
apresentados. É o dinheiro que vai para o bolso das multinacionais que
assumiram o controle do campo de Libra (e assumirão o resto do pré-sal se não
pararmos esta entrega). O futuro lucrativo destas empresas sim, está garantido
pelo leilão realizado nesta segunda feira, e não o futuro de nossos “filhos e
netos” como disse a presidenta na TV.
A conclusão de tudo isso é que estamos, sim, frente a um
crime de lesa-pátria. Trata-se da maior privatização já feita do patrimônio do
povo brasileiro. E, quem diria, num leilão realizado sob forte repressão do
Exército brasileiro e da Força PSTU Nacional de Segurança. Obra e graça de um
governo do PT.
Não é de se estranhar, portanto, a revolta que tomou conta
dos trabalhadores da Petrobrás (categoria que sempre foi muito fiel ao PT) que
promoveram uma forte greve em todo o país contra a entrega do petróleo
brasileiro. Expressão dessa revolta, o presidente do sindicato dos petroleiros
do Rio de Janeiro, Emanuel Cancela, em meio ao conflito com o Exército e a
Força Nacional no dia do leilão, anunciou a sua desfiliação do PT.
Cancela era militante histórico do PT. Não suportou mais ver
o que o partido ao qual havia dedicado grande parte da sua vida fazer o que fez
em mais este triste episódio. Como ele, são muitos os lutadores honestos que
seguiam e seguem ainda ligados ao PT, presos talvez mais ao que o partido foi,
do que ao que ele realmente é hoje. Mas não se pode viver do passado.
A luta vai continuar, agora pela anulação deste leilão que
lesou o povo e o nosso país e contra todas as privatizações. A luta vai
continuar contra o modelo econômico aplicado no país pelo governo do PT (o
mesmo que o governo tucano aplicava). Trata-se da luta para construir o futuro.
E o futuro libertário e socialista que o povo brasileiro e o Brasil precisam
não será construído com o PT. Terá de ser construído contra este partido.
Eu não falo isso com alegria. E me solidarizo publicamente
com o companheiro Cancela. Fui fundador do PT, em 1980, e dediquei muitos dos
melhores anos da minha vida à construção deste partido. Melhor seria que não
tivesse acontecido o que aconteceu com o PT. Mas é preciso reconhecer quando é
preciso buscar outro caminho, para não perdermos o rumo do objetivo que
definimos para nossas vidas. É a esta reflexão, o convite que deixo ao final
deste artigo.
*Zé Maria é metalúrgico, e presidente nacional do PSTU
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